7.8.08

Não que eu vá Votar no Maluf, mas Princípio é Princípio...

E mais uma vez o STF entra com os dois pés no peito dos juízes brasileiros.

A AMB (associação dos magistrados brasileiros) cutucou o STF para que os ministros se pronunciassem sobre a candidatura de pessoas com a ficha suja. Essa ficha suja, na visão da AMB, impediria que a pessoa concorresse em qualquer eleição. Pois o STF acha o contrário.

Os magistrados unidos do Brasil se esquecem que existe, desde 88, o príncipio da presunção de inocência. Não adianta espernear, reclamar e fazer biquinho, não transitou em julgado a sentença condenatória, o réu deve ser considerado inocente para todos os efeitos. Isso inclui direitos políticos de votar E ser votado.

A presunção de inocência seja, talvez, o princípio mais importante para as pessoas que lidam com o direito penal. Dela derivam quase todos os direitos e garantias essenciais para impedir que os réus brasileiros virem Josef K's.

Pois ontem, no jornal da globo (depois da lambança do SPFC contra o fluminense...), o repórter que cobre os eventos em Brasília disse que a opinião pública ficaria insatisfeita com a decisão, que a decisão ia contra o que a população queria etc. e o mais absurdo foi o presidente da AMB confirmando a afirmação do repórter.

Pois bem, opinião pública uma ova - opinião publicada, isso sim. E mais, o dia que as decisões relativas a direitos fundamentais forem tomadas tendo por base a opinião publicada, teremos a ROTA (o BOPE de São Paulo) na rua todo dia, esquartejamento de presos em praça pública e execuções por pelotão de fuzilamento (e a bala ainda vai ser cobrada da família do sujeito).

Outra coisa, a pessoa tem o direito de votar em quem ela quiser. O cidadão que se informe em quem está votando. Votou errado? Assuma a culpa e cobre seus direitos. Não adianta votar e ficar lamentando 4 anos (isso se a pessoa lembrar em quem ela votou).

Essa é a beleza do jogo democrático: ou o eleitor se informa, vai atrás e participa ou vira massa de manobra. Não adianta os juízes pedirem para o STF permitir que eles possam julgar contra um princípio constitucional para impedir que as pessoas votem em candidato X ou Y. Não adianta tentar usar o processo como arma ou filtro para qualquer outra coisa que não seja para garantir os direitos do réu contra a atuação coercitiva estatal.

Agora, se a AMB acha que o cidadão brasileiro é estúpido e votará em candidatos claramente mal intencionados, sem preparo e incopetentes, que peça o fim do sistema democrático (melhor não dar idéias...).

Escrito ouvindo: Fado Tropical (Chico Buarque, Chico Canta Calabar)

11 comments:

Técnico disse...

Eu também achei inoportuno o obrar da AMB, nesse sentido.

Mais do que qualquer coisa, devemos pugnar por uma unidade de posicionamento: ou bem, vamos perquirir os fundamentos constitucionais - e, eu prefiro que seja assim; ou bem, vamos esquecê-los. O que não se pode tolerar é esse stabelishment, ora sim, ora não.

Mas voltando ao tema central, eu acho que às carreiras eletivas, devia-se exigir - como se exige em alguns concursos - ilibada conduta pública e privada. Para evitar evitar que o candidato, ora eleito, faça na vida pública o que faz na privada, manja?

Essa tenativa da AMB, além da singeleza, expôs "meia-dúzia" de gatos pingados, e já conhecidos, frise-se.

Abraço.

Anônimo disse...

Não creio que a inelegibilidade de candidato político que ainda não teve sentença penal com trânsito em julgado afronte o princípio da presunção de inocência. Há outros princípios igualmente importantes para uma República, como por exemplo o princípio da moralidade. Além disso, as esferas civil, penal e administrativa são autônomas, e o princípio da presunção de inocência deve ter essa preponderância maior no âmbito penal. Ao se negar que um político com "ficha suja" se candidate, está se buscando preservar a moralidade administrativa, isso não quer dizer que ele deva ser considerado culpado no âmbito penal. Igualmente ocorre na investidura de certos cargos públicos, como por exemplo para juiz ou promotor, há toda uma investigação de vida regressa do sujeito, pois é razoável que não haja nenhuma suspeita em cima de alguém que vá ocupar tal cargo. Considero extramento fraco o argumento de alguns de que isso causaria perseguição política, para se aceitar uma denúncia há pelo menos um mínimo de indícios, a maioria dos juízes não aceita uma denúncia assim a toa, ainda mais agora que me parece que haverá a defesa prévia antes do recebimento da denúncia. A partir desse momento seria razoável exigir-se que alguém não poderia se candidatar, mas aí também em concordo em um aspecto com o STF, já seria função do legislativo estabelecer tal parâmetro, só finalizando recomendo a leitura desse artigo, que ressalta esse último aspecto:

http://www.ibgf.org.br/index.php?data[id_secao]=2&data[id_materia]=1734

Pedro Schaffa disse...

Olá a todos,

Respondendo ao Henrique:
A presunção de inocência não é um princípio puramente penal, é um princípio constitucional e, portanto, se aplica em todo e qualquer caso.

No caso dos candidatos com ficha suja, não há independência entre as esferas penal e administrativa, uma vez que a segunda se apóia na primeira para impedir alguém de fazer algo.

Portanto, o princípio da presunção de inocência, mesmo se considerado puramente penal, deve ser aplicado para que não haja reflexos negativos de uma esfera (penal e mais grave) em outra (administrativa).

Segundo: o eleitor que se informe e, informado, decida se quer ou não votar em alguém. Será que alguém condenado por injúria é muito pior do que o Maluf?

Terceiro, essa diferenciação bonzinho/malvado, é maniqueísta. Levando em consideração, p. ex., que o MPF não denuncia ninguém que tenha sonegado até 10.000 reais em impostos, mas o MP estadual denuncia qualquer pessoa que furtar uma bicicleta (e que não é crime de bagatela, de acordo com o TJ-SP) nós estaríamos diante de um impasse tremendo. O industrial sonegador pode se eleger, mas o pedreiro que roubou a bicicleta não.

Ainda acho que tudo isso se resolve somente pelo voto e pelo acesso à informação. Não sou contra a divulgação de uma lista com o nome de todas as pessoas que estão sendo processadas, sou contra a proibição expressa delas não participarem do jogo democrático.

O voto é livre e secreto, cada um faz o que quer com ele. É essa minha opinião.

Abraços e participe sempre!

Anônimo disse...

Mas o problema é que a maioria dos candidatos com processo crime não são sujeitos que cometeram furtos de bagatela ou injuriaram alguém, são sujeitos que fazem parte dessa alta criminalidade do colarinho branco, que causa danos irreperáveis ao erário público e continuam por aí, as vezes com condenação até em segunda instância, mas ainda com recurso e portanto presumidamente inocentes, só esperando o seu crime prescrever, graças aos seus caros e habilidosos advogados. Mas entendo a sua posição, a respeito e considero muito salutar esses debates, afinal as divergências são fundamentais em uma democracia. Continuo um grande fã do blog. Abraços

Promotor de Justiça disse...

Ótimo Blog!

Técnico disse...

Olá Pedro, tudo certo?

Quando puder dá uma olhada nesses sites:

http://www.ihj.org.br/poa/

http://www.leniostreck.com.br/

Abraço.

Anônimo disse...

Concordo com Schaffa, o principio da presunção de inocência, neste caso, está em harmonia com a instrumentalidade do processo.

A instrumentalidade propõe que o processo não constitui fim em si mesmo. Legitimando por si só, punições e presunções decorrentes da sua simples propositura.

Além de necessário para se constatar uma situação de fato, o processo, findo seu percurso, legitima a punição por parte do Estado.

Como é possível, pela instrumentalidade, legitimar punições sem utilização de qualquer meio objetivo metodológico? O processo é método; é instrumento pormenorizado, pensado e construído para o fim de se atingir função sócio-político- jurídica.

Temos que tomar cuidado com "fatos notórios" que por si só ensejam a propositura de processo crime, mas não legitima nenhuma punição.

Repito: Além de se constatar situação de fato, a punição Estatal só é legitima se percorrida metodologia, que é o processo. Tendo seu termino no Trânsito em julgado.

Unknown disse...

É a primeira vez que entro neste blog e devo dizer que a empatia foi imediata. Entretanto, não concordo com o Pedro quando afirma ferir o princípio da presnunção de inocência.

1.A natureza dos princípios é fluida, devendo-se sobrepor, quando em conflito, o que melhor se enquadrar ao caso concreto (vide Dworkin e Marinoni) através de um processo dialético (discussão) que o E. Democrático de Direito nos proporciona;

2.Onde entaria o P. da Igualdade ao não exigir dos ocupantes de cargo eletivo requisito precípuo para para o ingresso em outras classes públicas. Ainda que a natureza/tipo dos serviços públicos seja diferente, p. ex., entre um governador e um auxiliar administrativo, toda função pública envolve (a supremacia do) interesse público, devendo ser iguiais os requisitos para todos.

3.Concordo com os argumentos do Henrique, e não entendo que ele tenha julgado meramente penal o princípio em discussão. Acrescentaria apenas que é ingenuidade (eu realmente espero q seja ingenuidade!!!) do intérprete do direito julgar dogma o que está escrito na letra da lei. Para realmente fazer a diferença, o intérptrete deve olhar ao redor na hora de trabalhar: será que os cidadãos são realmente tão livres a ponto de escolherem mal por puro comodismo?! Achar isso é ignorar todas as demais forças que atuam na sociedade: mídia, poderes regionais, IGNORÂNCIA etc.

Em linguagem bem coloquial:
"Tá com a ficha suja? Vai pra casa até provar a sua inocência. Cargo eletivo não é profissão ou emprego e ninguém é insubstituível."
"A ânsia de participar da vida pública é muito grande? Existem outros meios constitucionais de participação democrática!"

Desculpem a falta de nexo e os erros. Eu estou no estágio e dei uma escapadinha para expor o meu ponto de vista...
Vamos continuar a discussão, que é muito rica.

Carvalho disse...

Concordo contigo quando falas do princípio da inocência.

Aliás, quando iniciaram-se os debates sobre esse tal de ficha limpa (moralização do imoralizável) eu já argumentava da mesma forma.

"E o devido processo legal foi pro pau?"

Aqui em Joinville-SC, temos um exemplo absurdo desse tal ficha limpa. Queriam tornar inelegível um cidadão que, enquanto vereador da cidade, participou de manifestações contra o aumento da tarifa do transporte coletivo junto aos estudantes, o que lhe acarretou alguns processos.

Qual o crime?
Art. 262 do CP (Condenado em primeira instância pelo Juiz amicíssimo dos donos das empresas, cuja residência serve de local para jantares periódicos).

Quem pediu a cabeça do vereador: Duas empresas de transporte. As duas únicas da cidade, que na verdade são uma só, pois dividiram-se em duas pra não caracterizar o monopólio, estão há mais de 40 anos na cidade e nunca passaram por licitação.

O que é o caso concreto, né!? Pela regra, deveria ser inelegível. Neste caso, pela opinião pública não.

Carvalho disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carvalho disse...

[...]

Ah! E eu pediria (sem qualquer pudor) o fim DESTE sistema "democrático".

"Pra comer aqui ou pra viagem?"

"Pra já!"

Só acho que o pedido da AMB seria um pouquiiiiiiinho diferente do meu, até porque a audição para "o clamor do povo" desse pessoal de lá é seletiva.

E a imprensa velha (parcialíssima, privada e tendenciosa - ao meu ver, um pleonasmo triplo) sempre confundindo, ou fingindo confundir, liberdade de expressão com liberdade de pressão.



Abraço!


P.S.: Não vi todo o conteúdo ainda, mas gostei desse blog.