8.5.08

Uma Freira, um Fazendeiro e Muita Coisa Sobre o Júri

Nesta semana outro crime (além do interminável caso nardoni...) foi bastante noticiado nos principais jornais do país.

Trata-se da absolvição do Fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, acusado de mandar matar (art. 121, §2º, I, CP) a Freira Dorothy Stang, em fevereiro de 2005.

Bom, como o crime é doloso contra a vida, a competência para julgá-lo é do Tribunal do Júri, que possui um procedimento próprio (veja aqui). Resumidamente ele é dividido em duas fases, uma para decidir se o acusado vai a plenário e a outra, obviamente, é o plenário.

Ocorre que no primeiro julgamento em plenário o Fazendeiro foi condenado à pena máxima para este tipo de crime, 30 anos. Crime grave, atenta contra os direitos humanos, absolutamente torpe o motivo etc. aceitável a pena.

No entanto, aqui é Brasil. E neste país as leis são feitas, discutidas e votadas com a mesma profundidade que a Veja discute políticas públicas.

Assim sendo, temos um recurso tão nosso quanto o futebol arte, a caipirinha e o carnaval: o Protesto por Novo Júri (PNJ). E foi este recurso brasileiríssimo que garantiu um novo julgamento ao fazendeiro.

Para entender resumidamente o PNJ (para entender direito clique aqui): é um recurso que cabe sempre quando o réu é condenado a uma pena maior do que 20 anos em processos de crimes dolosos contra a vida (mas é a pena por um crime só. Assim, não vale juntar as penas de crimes diferentes e também não vale dizer que 19 anos e 7 meses arredonda pra cima...).

Então, voltando ao nosso caso, o fazendeiro foi condenado a uma pena de 30 anos de prisão e, portanto, tinha direito a um julgamento por um novo Júri (daí o nome do recurso) automaticamente. Neste novo júri ele foi magicamente absolvido (ou seja num dia pena máxima, no outro nenhuma pena).

Isto aconteceu porque uma das principais testemunhas de acusação voltou atrás e negou tudo que tinha dito antes. No entanto, é muito questionável essa retratação da principal testemunha, principalmente porque agora temos um pistoleiro homicida convicto e confesso, mas nenhum mandante...

E agora, qual o próximo passo? O PNJ não impede que a decisão do segundo Júri seja apelada. Assim, o promotor, baseando-se nas incoerências entre os julgados e entre os depoimentos, deve apelar e, caso o Tribunal entenda que ele tenha razão, será realizado um terceiro júri (o tira-teima final) contra o qual não haverá mais nenhum tipo de recurso possível.

Por essas e por outras que eu me pergunto se o Júri realmente é uma forma válida para se julgar alguém.

Por não ser necessário justificar o voto, pelo teatro que se faz no plenário, pela incapacidade técnica dos jurados e porque razões de foro íntimo de cada um deles podem fazer com que a mesma pessoa seja condenada ou absolvida pelo mesmo crime e pelas mesmas provas, a única coisa que se altera é o sorteio dos jurados.

E, por último, ser garantista não é defender a impunidade ou ser cego à realidade. O que se defende é que se respeitem as garantias constitucionais e processuais do acusado e sejam seguidas as regras do jogo.

Não vejo nenhum problema de alguém ser condenado à pena máxima. Principalmente neste caso.

Escrito ouvindo: Killing In the Name (Rage Against The Machine, Woodstock 99)

3 comments:

Anônimo disse...

Você escreve muito bem!..está de parabéns...

Sou estudante de Direito...pretendo ser uma juíza..ainda chego lá..tenho que me esforçar muito....


Sucesso..saúde...e grandes realizações em sua vida

até mais

Pedro Schaffa disse...

Olá Mayrla,

obrigado pelos elogios!
Boa sorte e muito estudo para virar juíza.

Abraço!

Breno Machado disse...

Estou no primeiro ano de Direito, mas sinceramente, nunca tinha analisado esta possibilidade de se acabar como o Tribunal do Júri, mas os seus argumentos em relação a questão teatral e a falta de critérios a que os jurados devam se submeter são realmente válidos. Acredito que seja uma assunto que realmente merece um debate profundo. De qualquer forma, acho que está de parabéns pela sua visão a respeito do assunto.