15.5.09

O juiz das garantias no anteprojeto do CPP

Pois é, no último post sobre o Anteprojeto do CPP (ACPP) dei uma olhada na investigação criminal (que mudou, pero no mucho).

Só que este post é sobre uma das maiores mudanças que poderia ocorrer no processo penal brasileiro. Se essa parte passar, esqueça tudo que você já aprendeu sobre processo penal no Brasil (e pra mostrar que tamanho não é documento, somente 3 artigos - o 18 não conta porque é só burocrático - vão causar esse abalo).

Os arts. 15 a 18 do ACPP criam o juiz das garantias. Sim, um juiz que está lá só pra garantir! Tá, garantir o que?

O art. 15 responde: O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário (tem um monte de detalhes nos incisos, que você pode ver lá no final do post, no texto original do ACPP).

Ou seja, é um juiz criado para controlar os atos da polícia e do MP durante a investigação pré-processual (o processo começa com o recebimento da denúncia). Meu, esse juiz vai ser "o cara".

Ele vai servir para evitar que o juiz que julgará a causa tenha qualquer contato com provas, prisões, decisões etc. até que o processo chegue na fase processual. Vai ser um puta filtro para garantir que o processo não seja influenciado por absolutamente nada ilícito ou que faça a causa pender para um lado ou outro que não sejam as provas legítimas.

Além disso, ele que vai decidir sobre as prisões cautelares na fase pré-processual, observando a legalidade, necessidade e cabimento delas.

Há só um porém, de acordo com o art. 16, ele só existe nas causas que não sejam de menor potencial ofensivo (cuja nova definição será analisada num momento oportuno).

E pra garantir que não tenha maracutaia, do tipo "não tem outro juiz na comarca, então eu mesmo julgo", o art. 17 é bem claro ao afirmar que qualquer juiz que atuar como juiz de garantia não pode atuar como juiz do processo.

Na verdade, quase todo o mundo já adota essa história de um juiz durante a investigação e outro durante o processo, até porque é meio estúpido imaginar que o juiz que, durante a investigação, considera uma prova ilícita por problemas formais - mas que mostra claramente que o cara cometeu o crime - não vá tentar um malabarismo jurídico para condenar o sujeito.

Por essas e outras que eu ainda acho que o Brasil é o país do futuro. Agora é uma porcaria, mas amanhã quem sabe...

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CAPÍTULO II
DO JUIZ DAS GARANTIAS

Art. 15. O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário, competindo-lhe especialmente:
I – receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do art. 5º da Constituição da República;
II – receber o auto da prisão em flagrante, para efeito do disposto no art. 543;
III – zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido a sua presença;
IV – ser informado da abertura de qualquer inquérito policial;
V – decidir sobre o pedido de prisão provisória ou outra medida cautelar;
VI – prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las;
VII – decidir sobre o pedido de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa;
VIII – prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em atenção às razões apresentadas pela autoridade policial e observado o disposto no parágrafo único deste artigo;
IX – determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento;
X – requisitar documentos, laudos e informações da autoridade policial sobre o andamento da investigação;
XII – decidir sobre os pedidos de:
a) interceptação telefônica ou do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática;
b) quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico;
c) busca e apreensão domiciliar;
d) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado.
XIII – julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia;
XIV – outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo.
Parágrafo único. Estando o investigado preso, o juiz das garantias poderá, mediante representação da autoridade policial e ouvido o Ministério Público, prorrogar a duração do inquérito por período único de 10 (dez) dias, após o que, se ainda assim a investigação não for concluída, a prisão será revogada.
Art. 16. A competência do juiz das garantias abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo e cessa com a propositura da ação penal.
§1º Proposta a ação penal, as questões pendentes serão decididas pelo juiz do processo.
§2º As decisões proferidas pelo juiz das garantias não vinculam o juiz do processo, que, após o oferecimento da denúncia, poderá reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso.
§3º Os autos que compõem as matérias submetidas à apreciação do juiz das garantias serão juntados aos autos do processo.
Art. 17. O juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências do art. 15 ficará impedido de funcionar no processo.
Art. 18. O juiz das garantias será designado conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal.

3 comments:

Unknown disse...

Francamente,o juiz das garantias é a coisa mais absurda que eu já vi,fere o direito penal,fere principios além do direito penal,a prevenção deixará de existir,e pior a identidade fisica do juiz morreu.
Os principios são a base do direito,se não fossem importantes não fariam parte do ordenamento.

Anônimo disse...

Basta criar impedimento para o juiz que atuou nas investigações não decidir nada depois da denúncia, e não dividir a Magistratura, já cada vez mais fraca.

Tatielle disse...

Aprovadissima a mudança!
Como seria possível um novo CPP de sistema acusatório na nossa realidade inquisitorial?
Claro que ainda restam algumas duvidas a cerca do juiz das garantias, mas que essa mudança será uma grande vitória, isso é certeza.